JEREMIAS 20.7 – Deus enganou Jeremias?
Introdução:
Este estudo visa analisar as passagens bíblicas de 1 Reis 22: 20-23, 2 Crônicas 18: 18-22, Jeremias 04:10, 20: 7 e Ezequiel 14: 9, explorando a aparente contradição entre a soberania divina e as ações humanas. Abordaremos o conceito de permissão divina diante do mal, examinando as implicações teológicas e éticas desse fenômeno, especialmente no contexto de Deus permitir enganos e ações questionáveis.
No âmbito teológico, a relação entre a soberania de Deus e as ações humanas muitas vezes levanta questionamentos complexos. Este estudo se concentrará em passagens bíblicas que aparentemente atribuem a Deus a permissão ou até mesmo a execução de ações consideradas moralmente questionáveis. Particularmente, exploraremos as implicações dessas passagens à luz do entendimento teológico contemporâneo sobre a providência divina.
A soberania de Deus e as ações humanas
O cerne da questão reside nas passagens que mencionam Deus permitindo ou até mesmo agindo por meio de enganos e maus comportamentos. Um exemplo notável é encontrado em 1 Reis 22 e 2 Crônicas 18, onde Deus permite um espírito mentiroso influenciar os profetas de Acabe. Neste contexto, é crucial distinguir entre a ação positiva de Deus e Sua permissão soberana. As Escrituras muitas vezes utilizam uma linguagem imperativa que expressa permissão, não necessariamente ações diretas de Deus.
Analisar as ações de Deus
Ao analisar as ações de Deus em relação a Acabe, vemos que Sua soberania é exercida não como um ato de mal, mas como uma permissão soberana para que escolhas humanas se desdobrem. Deus, ao permitir que os profetas mentissem, usa esse evento para cumprir Seus propósitos eternos, mesmo diante das más intenções de Acabe.
O caso de Jeremias, expresso em Jeremias 04:10 e 20: 7, destaca a complexidade da relação entre o profeta e Deus. A aparente queixa de Jeremias reflete sua confusão diante das promessas divinas e das adversidades enfrentadas. No entanto, esses versículos não devem ser utilizados para questionar a fidelidade de Deus, mas para compreender a tensão inevitável entre as promessas de Deus e a realidade sofrida pelo profeta.
A Tradução na Linguagem de Hoje (TLH) interpreta o versículo da seguinte forma: "Ó Deus Eterno, tu me enganaste, e eu fiquei enganado" (Jr 20:7). No entanto, sabemos que Deus é um Deus da verdade, incapaz de mentir (Hb 6:18) ou tentar outros a pecar (Tg 1:13). Então, como podemos entender que Deus enganou Jeremias? A solução está na tradução da palavra hebraica (patah), que pode ser interpretada como "seduzir" (R-IBB) ou "persuadir" (ARA, SBTB). Nesse contexto, Deus persuadiu ou convenceu Jeremias a exercer um ministério sem que ele tivesse total consciência das consequências. Essa situação é semelhante ao que acontece no casamento. Seria muito cínico afirmar que todo romance e cortejo são moralmente enganosos, apenas porque o casal não pode prever todas as experiências que a união trará.[1]
Outra passagem abordada é Ezequiel 14: 9, onde Deus permite cegueira espiritual como parte de Seu julgamento. Neste contexto, a soberania de Deus se manifesta na permissão, não na promoção ativa do mal. O escritor bíblico destaca a abrangência da soberania divina sobre os eventos, mesmo quando estes estão vinculados à desobediência humana.
Ezequiel afirma que Deus levava os falsos profetas a falar e depois os destruía por agirem dessa forma. No entanto, isso pode parecer um ato enganoso. SOLUÇÃO: A ação de Deus não era nem enganosa nem moralmente coercitiva. Os falsos profetas gostam de dar falsas profecias. Portanto, não há coerção por parte de Deus ao induzi-los a praticar seu engano. O Deus soberano providenciou as circunstâncias de tal maneira que esses homens maus, por sua própria vontade, escolhiam proferir falsas profecias, revelando assim seu verdadeiro caráter e levando-os à condenação. Eles não amavam a verdade, então Deus permitiu que se entregassem ao erro, resultando em sua própria destruição (veja 2 Ts 2:10-11).[GEISLER 1999.p.180]
Conclusão:
Em síntese, as passagens analisadas não sugerem que Deus seja enganoso ou autor do mal. Em vez disso, evidenciam Sua soberania, revelando Sua habilidade de permitir que eventos se desenrolem em consonância com Seus propósitos eternos, mesmo quando confrontados com as ações humanas. Compreender a permissão divina como parte da soberania é crucial para uma visão teológica coerente e ética. Deus, em Sua infinita sabedoria, usa até mesmo as más escolhas humanas para cumprir Seus desígnios, demonstrando Sua capacidade de trabalhar através da complexidade das interações entre divindade e humanidade. Essa compreensão enriquece nossa visão da soberania divina, destacando a harmonia de Sua vontade soberana com a liberdade humana.
[1] GEISLER. Norman L. MANUAL POPULAR de Dúvidas, Enigmas e “Contradições” da Bíblia. traduzido por Milton Azevedo Andrade. — São Paulo: Mundo Cristão, 1999.p.176.
Fonte:
PALAVRAS DIFÍCEIS DA BÍBLIA Walter C. Kaiser Jr. Peter H. Davids FF Bruce Manfred T. Brauc
BÍBLIA EM PROTUGUÊS